Convivência pacífica

A guarda compartilhada foi oficialmente inserida em nosso ordenamento jurídico através da Lei 11.698/2008 e foi motivo de festa para os pais. A guarda compartilhada já existia mas somente era possível nos casos em que houvesse consenso entre os pai e mãe. Nos casos onde o acordo era impossível a guarda unilateral era, na grande maioria das vezes, dada às mães.

O motivo de tanta festa entre os papais era a própria redação da nova lei, que estabelecia a guarda compartilhada exatamente nos casos em que não houvesse acordo:
Art. 1.584. A guarda, unilateral ou compartilhada, poderá ser: (Redação dada pela Lei nº 11.698, de 2008).
§ 2o Quando não houver acordo entre a mãe e o pai quanto à guarda do filho, será aplicada, sempre que possível, a guarda compartilhada. (Incluído pela Lei nº 11.698, de 2008).
Os papais de plantão podem para de comemorar e colocar as barbas de molho. A lei é recente e como eu já havia previsto aqui no blog ninguém sabia qual seria o posicionamento dos Tribunais a respeito da nova redação do Código Civil. As primeiras decisões começaram a pipocar e, como já era de se esperar, demonstraram uma posição tristemente conservadora.

A 7ª Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, por exemplo, decidiu que a convivência pacífica entre os pais é um dos requisitos para que se permita a guarda compartilhada. Para os desembargadores do TJRJ a guarda compartilhada exige harmonia entre os pais. No processo em tela, o pai pediu a guarda compartilhada do filho. A mãe, não concordando, alegou que o relacionamento dos dois era marcado por brigas e disputas que culminaram com a separação.

O desembargador André Luiz Planella Villarinho, relator do processo,
enfatizou que pais que brigam constantemente e fazem acusações recíprocas impossibilita a guarda compartilhada. Em resumo: se há briga não há guarda compartilhada.

É um precedente perigoso. Óbvio que a convivência pacífica entre os pais era impossível: se não o fosse não haveria a separação. O fato de não existir acordo quanto à guarda dos filhos já demonstra a impossibilidade de uma convivência pacífica entre ambos e foi nesse sentido que a lei veio solucionar o conflito. A nova redação do Código Civil estabeleceu que a guarda compartilhada deverá ser a opção quando não há acordo entre pai e mãe.

A decisão do TJRJ faz o caminho inverso, voltando a situação ao que era decidido antes da edição da Lei 11.698/2008 - guarda compartilhada só quando houver acordo! Para que serviu a nova lei então?????

A nova lei veio para resolver o conflito e zelar pela criança no sentido de preservar as duas figuras necessárias para o seu desenvolvimento: pai e mãe. O TJRJ decidiu como de costume, à luz do Código Civil sem as modificações impostas pela nova lei. É como se a nova lei nunca houvesse sido publicada. Mais uma vez, os Tribunais (des)interpretam a lei numa atitude conservadora e completamente contrária ao espírito da lei e finalidade de sua criação.