Poxa tia!

O que recebo de perguntas a respeito de pensão alimentícia não está no Gibi. Algumas são dos próprios filhos, maiores, ansiosos por terem suas contas pagas a todo custo. Certa vez recebi uma pergunta curiosa de um visitante do blog. Sobre o que era a pergunta? Pensão alimentícia. Tratava-se de um jovem de 25 anos, trabalhava, não estudava e morava junto com suas outras 2 irmãs igualmente maiores, nenhuma delas estudante.

Segundo ele o pai era um "canalha" que nunca havia honrado com suas obrigações alimentares por contra própria e que, sem mais nem menos parou de pagar a pensão, PASMEM, quando ele - pobre jovem indefeso - completou os seus 20 anos de idade e optou por não fazer faculdade (???).

O que quero dizer leitor, é que se existe muito pai fugindo de suas obrigações para com a prole, existem filhos inescrupulosos/preguiçosos, que se esqueceram o significado de uma palavrinha antes tão sonhada e almejada: maioridade.

Não sei qual a sua idade leitor, mas na
minha época de "aborrecente", os 18 anos eram sonhados e perseguidos. "Quando eu tiver 18 anos terei meu próprio emprego e meu próprio dinheiro". "Quando tiver 18 mandarei no meu nariz". Eu mesma tive meu primeiro emprego aos 16 anos de idade, obtido para custear meus karate-gi e cordas/pedais para minha guitarra. Meu primeiro salário como caixa de supermercado foi integralmente gasto em uma super ponte para microafinação floyd-rose. Eu digo, nada, absolutamente nada no mundo tem o mesmo gosto de liberdade do primeiro salário ou da primeira conta paga. Infelizmente alguns filhos se esqueceram ou nunca provaram essa liberdade.

Pais desnaturados e filhos folgados à parte, a 3ª Turma do Superior Tribunal de Justiça chegou a uma decisão importante com relação ao direito de alimentos contra parentes. Creio que a grande maioria já sabe que a obrigação alimentar se estende aos avós paternos ou maternos, caso o pai ou a mãe não tenha condições de arcar com esse encargo. Mas e os outros parentes? Se o pai está desempregado e tem um irmão "bem de vida" pode o filho entrar contra o tio?

Para o STJ NÃO. Os parentes colaterais de terceiro grau, ou seja, sem descendência direta, não são obrigados a pagar pensão alimentícia. A questão decidida no REsp 103.284-6 chegou ao Tribunal Superior após recurso do Ministério Público, contra dois sobrinhos que pediam pensão alimentícia para suas tias idosas.

Os sobrinhos entraram com ação de alimentos contra as irmãs de seu pai e pediam contribuição para complementar a pensão, no valor de 3 salários mínimos. A despeito das tias idosas - 69 e 70 anos - comprovarem em juízo que tinham altos gastos com medicamentos e médicos devido à avançada idade, o juiz - um insano em minha modesta opinião - deferiu o pedido dos sobrinhos, condenando as velhinhas ao pagamento de um salário mínimo mensal. Para o juiz, o fato das tias já terem ajudado os sobrinhos em outras oportunidades comprovava que elas sabiam das necessidades dos sobrinhos e que portanto assumiram tal encargo.


V
eja a que ponto chegou a cabeça desse magistrado: eu ajudo por liberalidade e passo automaticamente a ser responsável. Se essa linha de raciocínio fosse seguida ao pé da letra, seríamos responsáveis por cada pedinte que ajudássemos na rua! Você deu um real? Então é responsável! Socorro!!!

Como as tias são idosas mas não são bobas, recorreram da sentença. O Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul em uma decisão de deixar qualquer um perplexo, CONFIRMOU a decisão de primeiro grau e manteve a condenação - uma foi condenada a pagar a quantia de um salário mínimo e outra, a 50% do salário mínimo.

O Ministério Público gaúcho recorreu ao STJ. A relatora do Recurso Especial, ministra Nancy Andrighi, em uma decisão muito bem embasada destacou:
Se as tias paternas, pessoas idosas, sensibilizadas com a situação dos sobrinhos, buscaram alcançar, de alguma forma, condições melhores para o sustento da família, mesmo depois da separação do casal, tal ato de caridade, de solidariedade humana, não deve ser transmutado em obrigação decorrente de vínculo familiar, notadamente em se tratando de alimentos decorrentes de parentesco, quando a interpretação majoritária da lei tem sido de que tios não devem ser obrigados a prestar alimentos aos sobrinhos. Trata-se de um ato de caridade, de mera liberalidade, sem direito de ação para sua exigência.

Decisão exemplar, inclusive no tocante a ressarcimento de parcelas já pagas. Se as tias ajudaram por liberalidade imbuída no espírito de solidariedade, não poderão pedir que a mãe desnaturada lhes devolva o dinheiro que já gasto com os sobrinhos. Cavalo dado não se pede de volta, oras!

Importante a decisão. Muitos juízes ainda se viam em maus lençóis, sem parâmetro para julgar pedidos de alimentos contra colaterais. Depois dessa decisão do STJ ficará, sem dúvida, mais fácil.

REsp 103.284-6