Foi notícia nos jornais do país na última terça-feira (19/02) uma decisão do juiz Zilmar dos Santos, do Fórum de Palmas/TO, que libertou 27 condenados por crimes hediondos.

O juiz concedeu a liberdade para condenados por tráfico de drogas, homicídio qualificado, latrocínio e estupro depois de terem cumprido 1/6 da pena. Motivo da concessão? Uma brecha na lei. Vamos entender o que acontece?

Em 1990 foi sancionada uma lei que a meu ver foi uma das maiores conquistas da sociedade em matéria penal nos últimos tempos. A lei dos Crimes Hediondos proibia a progressão de regime prisional nos casos de crimes considerados hediondos ou a eles equiparados:


  • extorsão mediante seqüestro e na forma qualifichomicídio (art. 121), quando praticado em atividade típica de grupo de extermínio, ainda que cometido por um só agente, e homicídio qualificado

  • latrocínio (art. 157, § 3o, in fine);

  • extorsão qualificada pela morte (art. 158, § 2o);

  • estupro (art. 213 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único);

  • atentado violento ao pudor (art. 214 e sua combinação com o art. 223, caput e parágrafo único);

  • epidemia com resultado morte (art. 267, § 1o).

  • Genocídio
Os equiparados para fins de progressão de regime e demais disposições da Lei 8072/90 (Lei dos Crimes Hediondos), os 3 "Ts":


  • Tráfico de Entorpecentes

  • Terrorismo

  • Tortura
Será que preciso explicar ao leitor o motivo pelo qual esses crimes foram tratados de forma diferenciada? Não creio...

Pois bem, em 2006 o STF em uma atuação abaixo do medíocre, considerou inconstitucional a proibição a progressão de regime estabelecida pela lei dos Crimes Hediondos. Entretanto, o que foi lamentável em se tratando de uma Corte Suprema, deu uma decisão incompleta limitando-se a dizer a respeito da inconstitucionalidade da matéria. Não regulou. Apenas suspendeu a eficácia. Isso mesmo, a nossa Suprema Corte se "esqueceu" de dizer qual o tempo de pena o condenado por crime hediondo deveria cumprir para que fizesse jus à progressão de regime.

Com a decisão o STF simplesmente jogou no lixo a acertada diferenciação estabelecida pela Lei 8072/91 e equiparou crimes antes considerados hediondos a crimes comuns, pois não havia tempo mínimo diferenciado de cumprimento em regime fechado para aquisição de direito a progressão de regime.

Em março de 2007 o Congresso Nacional, através da Lei 11.164/2007 determinou que o condenado somente teria direito a progressão de regime após cumprir 2/5 da pena para réus primários e 3/5 para reincidentes.

E o que aconteceu naquele ano entre a decisão incompleta do STF e a edição da Lei 11.164 que regulou a matéria? Respondo: coube ao juiz de primeiro grau determinar o tempo que o condenado deveria cumprir para fazer jus a progressão. A maioria seguia a regra dos crimes comuns: liberar os presos que cumprissem um sexto da pena. E o que mais poderiam eles fazer?

“A lei que disciplina agora o cumprimento das penas dos condenados por crimes hediondos só se aplica aos crimes ocorridos de março de 2007 pra cá. Ela não pode retroagir. Esse é o entendimento e é em razão disso que os que foram condenados estão se aproveitando dessa lacuna legal" afirmou o juiz Zilmar dos Santos, em reportagem ao Estadão.

Lendo a notícia no Conjur, me deparei com o comentário wilson (Oficial de Justiça ) postado em 20/02/2008 às 16:37 que dizia: "Tecnicamente perfeita a decisão. Não há outra exegese possível.. É o preço que a sociedade paga pela democracia, interpretando as normas penais em favor sempre em favor do réu. "

Infelizmente não posso discordar do comentarista. A decisão foi tecnicamente perfeita. É o preço que a sociedade paga pela democracia. É o preço que pagamos pelo Estado Democrático de Direito. Nos sujeitamos ao sistema jurídico existente no país, que diz que a Lei não pode retroagir. Aliás, a lei maléfica não pode retroagir pois a lei mais benéfica ao réu retroage SIM.

O Brasil criou uma cultura de "proteção" aos criminosos, talvez seja pelo fato de que nosso Congresso está cheio deles. No Brasil o condenado é tratado como "coitado" pois supostamente foi vítima do abandono do Estado, que não provê educação de qualidade e outros serviços que obrigatoriamente deveria prestar.

O que o brasileiro, "bonzinho" por natureza, não entende é que ao justificarmos as atitudes dos criminosos, viramos as costas aqueles que, mesmo sendo vítimas do mesmo abandono do Estado, lutam e conseguem levar uma vida justa e dígna. O que mais ouço quando acontece um crime de grande projeção na mídia é: e os direitos humanos do preso?

Ah amigos... quantos não são igualmente vítimas do sistema de saúde ineficiente e mesmo assim levam a vida sem matar? Quantos não tem acesso a um ensino de qualidade e ralam sozinhos nos livros para passar em vestibulares concorridos por méritos próprios? Quantos não acordam as 4 da manhã e trabalham em dois empregos para garantir o sustento da família? Onde está o direito deles de viver sem medo em uma sociedade hoje tomada pela criminalidade?

As vezes me pergunto se não é um preço alto demais o que estamos pagando. Quando será que gastamos para manutenção de Deputados, Senadores, Juizes, Vereadores, etc, para que o Brasil esteja na situação em que se encontra hoje? Quem foi que já se atreveu a colocar na ponta do lápis o "preço" dessa tão amada democracia? Aliás, que democracia?

Não crucifiquem o Juiz . A decisão foi absolutamente correta. A lei não pode retroagir. Traduzindo: ela só pode ser aplicada da data da sua criação para frente. Sendo criada em março de 2007, somente pode ser aplicada a crimes ocorridos a partir dai.
Crucifiquem o STF que não regulou a matéria ao decidir de maneira absurda suspender a eficácia da Lei dos Crimes Hediondos. Crucifiquem o Congresso Nacional por não mudar a CF no sentido de deixar para a legislação Ordinária a regulamentação sobre progressão de regime e outros detalhes da legislação penal.

Temos uma CF rígida. O que quer dizer? Que ela somente se modifica através de emenda que para aprovação necessita de um tipo diferenciado de aprovação. PORQUE NOSSA CF TEM QUE REGULAR TUDO? O que a matéria penal está fazendo na CF? Desde quando direito a progressão de regime deve ser constitucionalmente protegido?

Em qualquer país sério crimes hediondos são punidos com prisão perpétua ou pena de morte. No Brasil os libertamos, damos tapinhas nas costas e ainda estendemos o tapete dos direitos humanos... para que pisem!

O preço da democracia... está alto demais!